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Avanços e Contradições no PL das eólicas “offshore”

  • Foto do escritor: Álan Braga
    Álan Braga
  • 15 de dez. de 2024
  • 4 min de leitura

A exploração de energia eólica, que ocorre a partir da movimentação das pás pelo vento, acionando um aerogerador capaz de transformar a energia cinética em energia elétrica, é uma das principais apostas do mundo para a descarbonização. Energia fotovoltaica e a energia eólica são os “hot topics”, quando o assunto é energia renovável e transição energética.  


O Brasil é notoriamente, dentre as grandes economias e populações, um dos países com a matriz energética mais renovável. Grande parte dessa geração provém das hidrelétricas, resultado de um longo processo histórico de implantação de grandes projetos nas bacias do Rio Paraná e nas regiões Sul e Sudeste do país. Com a necessidade de descarbonização e “phase-out” dos combustíveis fósseis, o Brasil é referência e começou a expandir sua geração nas fontes renováveis em destaque no momento: eólica e solar. 


A energia eólica já representa 16% da matriz elétrica brasileira, com 33,5 GW de capacidade instalada. Para fins de comparação, essa capacidade é equivalente à de aproximadamente duas usinas de Itaipu (até hoje, a maior do mundo em geração de energia elétrica). Nesse contexto, o Brasil parece estar avançando de maneira positiva, no entanto, ao observar acontecimentos recentes, o país parece estar dando 2 passos na direção certa, ao mesmo tempo em que dá 1 passo para trás


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Todavia, como veremos a seguir, apesar dos avanços nas energias renováveis, o Brasil ainda enfrenta desafios que podem ameaçar seus objetivos de descarbonização.Na última semana, o Senado Federal aprovou o PL 576/2021, que estabelece um marco legal para tratar sobre o aproveitamento do potencial para a geração offshore de energia elétrica. De forma mais didática, o projeto visa tratar da exploração de energia gerada em alto mar, ou seja, que se situa “em área de mar territorial, da plataforma continental, da zona econômica exclusiva (ZEE) ou de outro corpo hídrico sob domínio da União”. 


A geração eólica em alto mar tem uma série de desafios, afinal, a instalação de grandes parques eólicos exige uma engenharia sofisticada, além disso, há grandes dificuldades na transmissão da energia gerada em alto mar para os principais distribuidores. Esses desafios são traduzidos em um maior custo neste tipo de empreendimento, em relação a um parque eólico “onshore” (instalado em terra). Apesar dos desafios, a instalação de grandes parques no mar também apresenta vantagens, como a constância e força do vento, geralmente superiores às instalações no solo. Ademais, existem menos obstáculos em relação aos impactos em populações e desapropriações de terra. 


Ao entrar especificamente no projeto aprovado pelo Senado, o texto traz uma regulação sobre a instalação desses projetos, sendo vedados em áreas coincidentes à produção de hidrocarbonetos (combustíveis fósseis); em rotas de navegação; e em áreas protegidas pela legislação ambiental. São estipuladas regras atinentes aos leilões, as outorgas às empresas, ao monitoramento de projetos e são estipuladas obrigações aos atores do setor. 


Esse marco legal é fundamental para conferir maior segurança jurídica aos investidores de projetos de geração offshore. Ok, se o marco legal foi aprovado, com regras claras e obrigações para o desenvolvimento de energia renovável, por que o Brasil estaria dando um passo para trás? 


Ampliando, de forma mais minuciosa, a análise do texto do projeto aprovado, percebe-se que existem temas ali que fogem do foco do projeto, os famosos “jabutis”. De maneira didática, são alterações ou novas legislações, dentro de um projeto de lei, que versam sobre outras temáticas. 


Nesse caso, um projeto que aprovava um importante marco legal, também modificou a lei que possibilitou a privatização da Eletrobras. Foram incluídas no projeto, contratações compulsórias de usinas termelétricas a gás natural, na ordem de 4,25 GW de potência. Ademais, fica incluído pelo texto a prorrogação da contratação das termelétricas a carvão mineral até 2050, sendo que anteriormente a operação dessas usinas estava prevista até 2040. Complementarmente, foram incluídas no texto a contratação compulsória de pequenas centrais hidrelétricas e plantas de hidrogênio. 


Segundo o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT/AP), o governo “vai vetar esse artigo, que é uma contradição ao projeto e vai aumentar o valor da energia elétrica”. Reforçando a fala do senador, a Frente Nacional dos Consumidores de Energia estimou um impacto de 9% no aumento da conta de luz, uma despesa total de R$ 21 bilhões até 2050


Além do aumento na conta de luz, é totalmente contraditório que em um projeto para incentivar um novo mercado de renováveis, as eólicas offshores, seja beneficiado o setor de carvão. O carvão mineral é o pior combustível fóssil do ponto de vista das mudanças climáticas, sendo o mais carbono intensivo — cerca de 10 a 15% mais intensivo em carbono que o petróleo e cerca de 40% mais intensivo em carbono que o gás natural. Para fins de contexto, o Reino Unido, em outubro de 2024, fechou sua última usina de carvão. Países como a China, altamente dependentes do mineral, aceleram o “phase-out” dessa fonte de energia, que além de altamente emissora de Gases do Efeito Estufa (GEE), também possui sua queima altamente intensiva em poluentes.    


Caso o presidente Lula não vete os trechos da legislação que são totalmente contraditórios e vão na contramão do mundo, viveremos um momento semelhante ao vivido no ano anterior (2023). Durante a COP 28, em Dubai, o Brasil reforçou sua candidatura para sediar a COP 30 na Amazônia, voltando a ser uma voz ativa em prol do desenvolvimento sustentável e da mitigação climática na arena internacional. Contudo, durante a COP, foi anunciada a adesão do país à OPEP+ —Organização dos Países Exportadores de Petróleo e Aliados —, o que soou novamente como uma grande contradição do país, que quer liderar a transição energética e se transformar em uma “potência verde”. Ressalta-se ainda que, caso o presidente vete os trechos, eles ainda poderão ser restabelecidos pelos parlamentares. Ou se trata o assunto do clima com a devida seriedade, ou as ambições brasileiras de ser uma referência não serão alcançadas e as oportunidades que se abrirão, provavelmente serão perdidas. Para alcançar esses objetivos ambiciosos, os interesses individuais, como os das indústrias de carvão brasileiras, não podem se sobrepor aos interesses nacionais do país. 







de forma detalhada, os fatores de emissão por combustível podem ser encontrados aqui: https://www.ipcc-nggip.iges.or.jp/public/2006gl/vol2.html




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